segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

Angelo Grillo deixa sua marca em Campos


Um cidadão do mundo sempre carrega uma grande bagagem. Não malas, sacolas ou bolsas, mas memórias. Angelo Grillo, chegou ao Brasil com uma bolsa de roupas e seu clarinete, para um congresso de músicos. Deixou o país neste domingo, porém, levando mais do que isso. Levando histórias que se juntam ao já grande repertório de um jovem ousado, que deixou seu país de origem para aprender outra língua e uma profissão, mas que, no meio do caminho, criou uma banda de rock, viajou pelo leste europeu e chegou mesmo a fazer sucesso. Já homem, porém, esse jovem, que em seus tempos de guitarra flertava com jazz e administrava crises internacionais com os colegas do grupo, descobriu no instrumento que imortalizou o jazzista Artie Shaw sua nova paixão e na música erudita, o canal para expressá-la. Viajando e viajando, chegou até as salas de aula da ONG ORQUESTRANDO A VIDA, onde ensinou e aprendeu.
DEDICAÇÃO

Nascido na Sardenha, ilha do mediterrâneo pertencente à Itália, Grillo era de família humilde. A mãe trabalhou para se formar médica e o pai, ainda encontrava tempo para trabalhar como voluntário junto a viciados em entorpecentes. Mesmo, a vida difícil, porém, não privou o Angelo e a irmã da cultura. E a música, veio como conseqüência, embora quase por acaso.

— Lembro que ainda muito pequeno, minha mãe me levava ao teatro, não sem algum sacrifício. Quando estava doente ou caía de cama, ela colocava Beethoven e Bach, para que eu pudesse melhorar. Assim, fui tomando gosto pela arte. Mas meu início na música aconteceu quando meu avô paterno comprou um teclado pequeno, porque havia colocado na cabeça que queria aprender a tocar. Ele, porém, não se deu bem com as aulas e acabou encostando o instrumento. Um dia, quando minha mãe entrou em meu quarto, eu estava tocando a música de uma propaganda. Tirei de ouvido. Então, me disse que devia estudar — relembra Grillo, que toca, ainda, piano e bateria.

Como sua cidade natal era pequena e não possuía conservatório, Angelo acabou se afastando, enquanto músico, das peças eruditas. A guitarra tornou-se não apenas objeto de aprendizado, mas meio de se aproximar de outros adolescentes. Quando foi para a Escócia, aos 18 anos, montou, junto de dois alemães, um francês, um inglês e um espanhol o Terminal Blue.

— Fui para a Escócia estudar enfermagem, pois descobri que lá havia bolsa para todos os alunos. Contou, também, para a escolha do curso a experiência de meu pai como voluntário e de minha mãe, como médica. Juntei-me a outros imigrantes e montamos o Terminal Blue. Era engraçado, pois, como cada um vinha de um país, tínhamos que administrar nossas idéias e vontades, a fim de chegar a um som coeso. Viajamos por quase toda a Europa Oriental e acabamos fazendo sucesso Lituânia e na Eslováquia. No fim, porém, a banda se separou, pois tínhamos objetivos diferentes: para os meus companheiros, a banda era um passa tempo entre os estudos que lhes dariam as profissões que sempre quiseram. Para mim, a música era a finalidade do meu esforço. Queria viver da música e achava que, para isso, tinha que ser famoso.

E foi cinco anos depois de embarcar para Edimburgo, na Escócia, que Grillo descobriria o instrumento que o possibilitaria realizar seu sonho.

— Aos 23 anos, descobri o clarinete. Minha irmã havia ganhado um de presente de natal de meu pai. Peguei, comecei a brincar. Em duas semanas tocava melhor que ela em seis meses, por já ser músico. Ela deixou o instrumento comigo e comecei a me dedicar. Pensei, “agora vou estudar sério”. Assim, parti para Barcelona, onde fiz conservatório. Quando terminei o curso, dei um basta. Queria música e não trabalharia mais de enfermeiro. Cheguei a tocar na rua, que é um ótimo termômetro para sua habilidade. Se você ganha dinheiro é porque está trocando bem — afirma Grillo, que, depois, se mudou para as Ilhas Canárias, onde integrou uma orquestra por três anos.

Foi quando decidiu vir ao Brasil, para um congresso de músicos em Curitiba, que Grillo, conhecedor apenas do samba e da bossa nova, cruzou o caminho das crianças de Campos.

— Em Curitiba, conheci Sarah, professora de flauta da ONG, e Marcos, maestro. Fomos juntos às oficinas, travamos amizade e acabamos tocando na orquestra formada ao fim do evento. Como trabalhei com crianças lá em Barcelona, resolvi vir a Campos — diz Angelo, que relembra com carinho aquela memória que passará a integrar a sua bagagem de andarilho do mundo. — Nunca me esqueceria da vontade de aprender dessas crianças. O primeiro é a vontade de criança de aprender. Estou acostumado a dar aulas para crianças ricas européias, que não têm dificuldade de estudar. Porém, aqui, há aqueles que não têm nada, nem mesmo o instrumento. Tem de usar o da escola. Mas há sanha enorme por conhecimento. Não tinha que falar nada duas vezes. Fala a primeira e eles faziam. Então, é surpreendente. Conduzi um concerto de Tchaikovsky e foi muito bonito.

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